Artigos publicados

A informação e o conhecimento na indústria de calçados.

 

É natural que aprendamos pela experiência, e seria absurdo pensar que a cada ano perdêssemos parte do conhecimento prático que adquirimos e recaíssemos nos mesmos erros em nossa vida pessoal por falta de conhecimento ou experiência.

 

Porém, nas empresas, o que entendemos como absurdo tende a ser uma realidade. Os profissionais que saem levam consigo o conhecimento de procedimentos e de problemas e suas soluções que ocorreram durante a sua permanência na empresa.

 

Alguém poderia argumentar que este conhecimento pode ser mantido pela contratação de profissionais que tenham a mesma qualificação ou conhecimento. A isto perguntaríamos: Terão? Ainda que sejam excelentes profissionais grande parte do “saber como” é muito relativo a cada empresa.

 

Assim, o propósito deste artigo é abordar o registro de informações, sua administração e possibilidades para a geração de conhecimento nas empresas. Trataremos alguns aspectos deste tema, com vistas ao seu desdobramento prático.

 

Para melhor entendimento dos propósitos do tema e sua adequação em relação aos interesses de empresários e funcionários ou colaboradores, se faz necessária antes uma breve reflexão.

 

Conceitos preliminares

 

Em sua etimologia a palavra informação vem do latim “informatio, onis”, delinear, conceber idéia, ou seja, dar forma ou moldar na mente. A informação pode ser definida como uma forma codificada (palavra, imagem, etc.) para transmitir conceitos sobre algo.

 

Por sua vez, conhecimento, em latim, “cognoscere”, vem de conhecer, conhecer pelos sentidos, conhecer por experiência, saber.

 

É dito que a informação se transforma em conhecimento na medida em que é interpretada, comentada, analisada sob diferentes pontos de vista, pelo grupo de pessoas que dela faz uso. Dentro do restrito propósito do tema aqui tratado, aceitaremos este conceito para prosseguirmos. Porém, temos que considerar  o fato que mesmo imagens de objetos, pessoas ou circunstâncias, não são estes em “si mesmos”, mas representações interpretadas segundo às características psicológicas de cada indivíduo ou pessoa. A palavra, ou a linguagem, tende a se distanciar ainda mais das coisas em “si mesmas”.

 

Mesmo dentro do conceito restrito atribuído à geração do conhecimento, a enorme massa de informação  hoje disponibilizada à comunidade pelos meios de comunicação, não é, portanto, conhecimento. Além disto, se observa a disseminação democrática de informações  inúteis, banais, irrelevantes e mesmo largamente nocivas. Contrariamente, as  informações relevantes, úteis, educativas  ou  que promovam a capacitação profissional, para a interação produtiva e colaborativa dos indivíduos, são restritas ou pouco disseminadas.

 

Ainda ocorre outro evento: A divulgação de informações úteis, especialmente no treinamento corporativo, por vezes faz uso dos chamados jargões profissionais. Temos assim o “informatiquês” o “economês”, etc., A administração também tem seu jargão, com o largo emprego de palavras oriundas do inglês, etc.

 

Evidentemente precisamos conceituar, ou emitir conceitos, porém não estamos aqui nos referindo ao uso do jargão e sim ao seu abuso ou a sua utilização fora da sua necessidade ou do seu objetivo prático. Este abuso resulta em  uma sublinguagem que necessita ser antes apreendida para, somente então, se compreender a informação transmitida.

 

Este abuso é contrário ao propósito primário da informação e todos nós devemos ter esta questão em conta, pois, por esta razão, podem ocorrer treinamentos em que o único objetivo alcançado é a familiarização dos participantes com o jargão apenas. Além do mais, tal ocorrência, tem seu custo financeiro...

 

Outra adversidade, associada  ao jargão, é a tendência a formação de subgrupos de pessoas dentro da empresa pelo uso da sublinguagem, ou, o que é mais comum na sociedade,  subgrupos já definidos fazerem uso de sublinguagem.

 

Estes  conceitos  não se referem a pessoas ou a instituições específicas, pois,  pretendem apenas dar a dimensão da responsabilidade  necessária à correta geração de informações que possam se transformar em conhecimento útil  à comunidade. Nisto, somos todos aprendizes com maior ou menor habilidade.

 

A informação na indústria. Exemplos na produção  calçados.

 

Para as empresas a  retenção das informações referentes as suas atividades é um dever e uma necessidade, assim como a compreensão de que as informações só se tornam em saber, ou conhecimento prático, pela interação humana ou de seus colaboradores. Portanto, não pode haver conflitos de interesses ou algo relativo aos propalados conflitos entre capital e trabalho, somente úteis a quem não representa nem a um nem a outro.

 

Mesmo que estes conceitos tenham amplo desdobramento, dentro e fora da empresa, tudo tem um começo. Como exemplos de começo prático, demonstramos na sequência três tópicos. O primeiro  e o segundo fazem uso de recursos informatizados ou computadores e o terceiro se refere ao treinamento no trabalho.

 

Tópico 1. Informações básicas sobre os processos de produção.

 

Para o registro de informações a informática tem suas ferramentas. Especificamente nos referimos aos bancos de dados onde textos ,imagens e vídeos podem ser armazenados, com toda a sorte de informações indexadas para  serem  recuperadas posteriormente.

 

As informações, em sua maior parte,  devem ser geradas, registradas e indexadas durante a execução do trabalho, podendo se aceitar a colaboração de pessoa ou facilitador nesta tarefa dentro da  empresa que ,como um todo , esteja determinada a este propósito.

 

Um tradicional  registro de informações se refere aos processos ou operações de produção, que é realizado pelos profissionais do setor de cronometragem ou de estudo do trabalho .A figura 1 descreve uma realidade básica bem conhecida que, embora possa  ter outras configurações, situa no tempo estes registros

 

Figura 1

Tempo >>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>

Concepção do produto

Desenvolvimento

Produção

Operações e estimativas de tempos de produção

Revisão e ajuste

Cronometragem em chão de fábrica

 

O que temos observado é que, para as estimativas (fundamentais para definição do preço de venda, análise de viabilidade econômica, planejamento da produção, etc.) os profissionais da área dispõe apenas de seu conhecimento , maior ou menor dependendo do profissional. Ocorre, frequentemente, das operações terem que ser digitadas integralmente a cada nova estação de lançamentos e vendas, tomando um tempo excessivo, comprometendo a realização adequada desta tarefa, além de ser causa de erros especialmente  na definição dos tempos de fabricação.

 

Para solucionar este problema e racionalizar estes procedimentos, temos sugerido e empregado uma alternativa simples, porém inexistente na maioria dos casos. Se  cada produto novo cadastrado (aqui entram particularidades de ficha técnica, etc. de cada sistema) receber uma identificação por tipo ou conjunto de produtos a qual pertence, o associando ainda a sua imagem ou foto , se tornará possível a recuperação de operações setoriais por  pesquisa de produtos similares.

 

Quando um novo produto for apresentado, para ter suas operações e tempos estimados, um produto similar é localizado na base de dados e suas operações  prontamente transferidas para o novo produto. Estas operações e tempos, então, deverão ser revistos e editados para sua perfeita adequação. Esta revisão pode fazer uso de procedimentos conhecidos, como a padronização prévia de operações , os tempos sintéticos, etc.

 

Na guia “Downloads & Vídeos” existe um vídeo (Estimativas de tempos auxiliada por sistema informatizado) que demonstra estes procedimentos em aplicativos práticos.

 

O que se observa é que a aplicação desta ferramenta, por profissionais interessados, progride pelo seu uso continuado, isto é , quanto mais se utiliza mais útil se torna, ocorrendo o seu desdobramento para outras funcionalidades e possibilidades.

 

Estas informações previamente existentes (operações e tempos padrão), interpretadas gerando conhecimento com sua utilização prática, podem ser ampliadas para outras atividades já existentes na maioria das empresas, as associando por exemplo:

 

Com informações de máquinas e dispositivos e suas regulagens.

Com informações metrológicas (espessura, pontos por cm, etc.).

Com informações de insumos (para acabamento, colagem, etc.)

Com informações de materiais.

 

Sempre lembrando que podemos recorrer a textos, imagens e vídeos.

 

Estes novos registros, normalmente, já ocorrem nas empresas, na sua maior parte  executados pelo setor de qualidade ou pela área técnica. Da mesma forma que as estimativas de tempos, o setor de qualidade deve ter registros padronizados já existentes e atualizados, referentes a processos , produtos, materiais etc., gerados pela execução anterior de seu trabalho diário.

 

Em procedimentos  básicos temos a integração e a partilha de informações entre dois setores. Os profissionais da cronometragem podem editar seus registros apenas, mas tem acesso aos registros dos responsáveis pela qualidade ou área técnica e vice-versa.

 

Nas inter-relações diárias destes profissionais(cronometragem e qualidade ou área técnica) e destes com os demais, estas informações serão, comentadas, analisadas, etc., as disseminando e  garantindo sua uniformidade. Esta uniformidade de informações e a ação conjunta, repercutem na análise e definição de custos de produtos, no planejamento da produção, nas compras,  na execução dos processos de produção, no produto final, etc.,  eliminando diversas causas de problemas, diminuindo as chances do produto ou processo falhar.

 

Estes procedimentos podem ser muito ampliados, por sua integração desde o planejamento e  execução dos projetos de desenvolvimento, envolvendo outros setores , profissionais e informações. Nesta ampliação, evidentemente, se considera a disseminação de informações de acordo às diretrizes da empresa. Exemplo: Planilhas ( no sistema) de custeio e apuração de preço de venda tem suas informações limitadas a pessoal específico segundo o critério de sigilo comercial da empresa.

 

Tópico 2. A geração de informações na implantação de  inovações e na solução de problemas.

 

Problemas ocorrem mesmo  por simples lei de entropia (ver leis da termodinâmica) que determina que, com o tempo, os sistemas tendem da ordem para a desordem.Como nada fica estático, um sistema (conjunto de processos, aplicativos, organismos e mesmo informações) que hoje é adequado ou organizado, mecanicamente tenderá à desordem, à desintegração e à degeneração se nada fizermos fora da rotina já estabelecida.

 

Estas características determinam  que esforços contínuos devem  ocorrer no sentido de manter ou aumentar a ordem. Além disto, devemos ter em conta que os esforços (energia) terão resultado se aplicados de forma inteligente ou inovadora, isto é, esforços (energia) por si só não bastam.

 

Na execução de procedimentos para a solução de problemas, ou mesmo para a inovação, diversas informações são geradas. Para um determinado problema a solução encontrada pode ter ocorrido por conhecimento de um profissional específico, ou pela interação do conhecimento de vários profissionais.

 

Muitas vezes se percebe que, passado um tempo, mesmo os profissionais que participaram da solução do problema não se lembram dos procedimentos empregados.

 

Assim, temos sugerido e empregado o desenvolvimento de recursos nos sistemas informatizados, que permitam o registro de procedimentos, para a solução de problemas ou para a implantação de inovações, durante a sua execução.

 

Sua lógica fundamental é bem simples e a figura 2 a demonstra. Quando problema ocorrer ou inovação for planejada, ocorrerá seu registro. Para este registro pode se fazer uso do facilitador mencionado no tópico 1, ou dos próprios responsáveis por solução de problema ou implantação de inovação segundo o caso.

Figura 2

Problema/Inovação

Indexação

Produto, setor, processo, tipo, especificação, Data, etc.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Detalhamento

Texto

Imagens

Vídeos, etc.

 

Etapas da solução / implantação

Descrição: Texto, imagens, vídeos, responsável, etc.

Planejado: Data /Hora início e fim.

Ocorrido: Data/Hora início e fim

 

Avaliação final

Texto

Imagens, etc.

 

O problema ou inovação é indexado ou associado a um produto específico, setor, processos, tipo ou especificação. Na sua descrição (texto) imagens e vídeos podem ser associados. As etapas a serem seguidas para solução ou implantação (com responsável, data e hora planejadas e ocorridas) ficam disponíveis em rede, atuando como uma agenda ou lista de tarefas diárias a executar ou pendentes.

 

A partir destes registros, filtros (simples e compostos) podem ser empregados durante a execução de soluções/implantações, referentes às datas, aos responsáveis, às tarefas pendentes, aos problemas ou inovações por data ou intervalo de datas, etc.

 

Após a solução de problemas ou a implantação de inovações, os filtros são aplicados especialmente através dos indexadores. Assim, problemas e suas etapas de sua solução, inovações e suas etapas de implantação, são recuperados prontamente. Por exemplo: Pesquisando problemas de colagem, todas as ocorrências são listadas, bem como os produtos em que ocorreram, insumos e materiais utilizados, fornecedores ou terceirizados envolvidos, solução empregada, etc. Da mesma forma, estatísticas destas ocorrências ao longo do tempo são geradas para análise.

 

Na criação destes recursos informatizados, contudo, deve haver grande ênfase no cuidado de se criar interfaces práticas aos usuários. Por exemplo: Muitos dados como os indexadores, responsáveis, etc., devem vir de tabelas associadas, com registros previamente existentes, para facilitar a inserção de novas ocorrências de problemas ou de inovações.

 

Tópico 3. Materiais: Otimização de aproveitamento dentro das metas de qualidade.

 

No que se refere aos materiais , normalmente são  registrados os consumos de materiais referentes às partes ou peças de cada produto apenas.

 

Nestes registros informações referentes a procedimentos de corte são consideradas como de conhecimento prático dos operadores. Porém, tivemos a oportunidade de instalar e gerir  procedimentos de cálculo e controle de consumos de materiais, com características diferenciadas, que possibilitaram a observação matemática dos índices de consumos ou aproveitamento de milhões de pares de calçados nos mais diversos tipos de materiais.

 

Desde então, constatamos a extrema relevância, para a ocorrência dos melhores índices de aproveitamento, em se informar aos operadores, de forma continuada, sobre detalhes do produto em relação ao produto final e acabado. Informações estas se referindo às áreas de peças que suportavam diferentes características dos materiais, por sua localização no produto  e pelas características do produto em si ( áreas de montagem, áreas de colagem, sobrepostos, estampas, apliques, etc., etc.).Da mesma forma, informações sobre diferentes possibilidades de encaixes de cada peça para a obtenção de menor área de consumo, associando estas informações à previa racionalização de navalhas ou facas.

 

Não é necessário salientarmos o enorme montante de capital diariamente envolvido nos materiais e o impacto de sua correta utilização nas finanças da empresas e no produto final a ser levado aos clientes.

 

Assim colocado pode parecer óbvio, mas é surpreendente como este procedimento é negligenciado na prática.

 

Estas informações podem ter um registro em banco de dados, mas o mais prático neste caso é a transmissão sistemática destas informações, direitamente ao grupo de colaboradores, a cada novo produto.

 

Isto exige um desempenho ao menos regular do desenvolvimento de novos produtos ou projetos. Nas tarefas  do novo projeto (ver “O planejamento do lançamento de linhas de produtos por cronogramas artigo e vídeos ) este evento deve estar listado  considerando a data e o responsável por sua execução.

 

A informação em institutos de pesquisa e associações de classe.

 

Detalhamos nestas descrições dois aplicativos que já desenvolvemos, além de procedimentos de treinamento, aplicados na prática ao longo dos anos dentro das indústrias de calçados e correlacionadas.

 

No entanto, entendemos que os princípios, aqui brevemente  demonstrados, podem ser estendidos para institutos de pesquisa e tecnologia, associações de classe, etc.,  em benefício de seus colaboradores diretos, associados e da comunidade em geral.

 

As informações armazenadas em bancos de dados podem ficar a disposição para consulta via Internet, disseminadas na forma de cursos on-line com aplicativos de ensino à distância ou por imagem e voz, consultoria de apoio on-line, fornecer suporte ao treinamento e à consultoria presencial etc.

 

Também é possível a troca de informações, sua interpretação, etc., com associados ou usuários externos afins.

 

Uma vez bem definidas, a estrutura do sistema e  as formas e modalidades de relacionamento colaborativo, as possibilidades de disseminação de informações e geração de conhecimento  tenderão a se multiplicar.

 

Rodolfo Mossmann

A informação e o conhecimento na indústria de calçados.

O artigo trata da geração de informações na indústria com exemplos práticos de seu uso como conhecimento na realização do trabalho.Publicado na Revista Tecnicouro ,edição 255 set/ 2010.

Caixa de texto: PRECEPTOR. Consultoria, treinamento, desenvolvimento, análise e instalação de sistemas.

E-mail: contato@preceptor.net.br